"Tudo me é lícito, mas nem tudo me convém" Carta do Apóstolo Paulo aos Coríntios

"Tudo me é lícito, mas nem tudo me convém [...]". (Carta do Apóstolo Paulo aos cristãos. Coríntios 6:12) Tudo posso, tudo quero, mas eu devo? Quero, mas não posso. Até posso, se burlar a regra; mas eu devo? Segundo o filósofo Mário Sérgio Cortella, ética é o conjunto de valores e princípios que [todos] usamos para definir as três grandes questões da vida, que são: QUERO, DEVO, POSSO. Tem coisas que eu quero, mas não posso. Tem coisas que eu posso, mas não devo. Tem coisas que eu devo, mas não quero. Cortella complementa "Quando temos paz de espírito? Temos paz de espírito quando aquilo que queremos é o que podemos e é o que devemos." (Cortella, 2009). Imagem Toscana, Itália.































segunda-feira, 27 de agosto de 2012

CORONELISMO, ENXADA E VOTO – Victor Nunes Leal



60 ANOS DE
"CORONELISMO, ENXADA E VOTO": A CONTRIBUIÇÃO DA OBRA E DO AUTOR.


João Henrique Catraio Monteiro Aguiar



 
Qualquer pessoa que queira entender a formação dos municípios brasileiros e o discutido conceito acadêmico "coronelismo" terá necessariamente de passar pela leitura de Coronelismo, Enxada e Voto: o município e o sistema representativo no Brasil (1949). A obra foi escrita por Victor Nunes Leal (1914-1985), sendo a publicação de sua tese apresentada em 1948 para concorrer à cátedra de Política (1943-1969) na Universidade do Brasil (que se tornaria posteriormente UFRJ). Pela mesma Universidade tornou-se bacharel em Direito - na Faculdade Nacional de Direito – e Doutor em Ciências Sociais – na Faculdade Nacional de Filosofia (1948) –, assumindo, em 1959, a presidência do Instituto de Ciências Sociais. Exercerá atividades didáticas também na ESG, ECEME, DASP, Universidade de Brasília e CEUB. Nascido em Carangolas (MG), tornar-se-á membro da Academia Mineira de Letras em 1976. Antes que seja aprofundada a temática do livro, cabe mencionar a destacada atividade do autor no campo jurídico e político.
Exerceu a advocacia de 1937 a 1956 e de 1969 a 1985. Trabalhou com o ministério de Capanema, como Oficial de Gabinete (1939-40) e Diretor do Serviço de Documentação do Ministério de Educação e Saúde (1940-43). Foi Chefe da Casa Civil da Presidência da República (1956-59). Esteve no cargo de Procurador Geral da Justiça do Distrito Federal (1956), Procurador do Tribunal de Contas do Distrito Federal (1960), Consultor Geral da República (1960), Ministro do Supremo Tribunal Federal (1960-1969), Ministro de Supremo Tribunal Eleitoral (1966-1969). Atuou de forma incisiva na esfera pública, tendo não só seus diferentes livros e ensaios publicados; como também participação em inúmeros congressos e jornais. Destaca-se também por sua presença em missões no exterior. Representou o Brasil na IV reunião do conselho de juristas do Conselho dos Estados Americanos (Chile, 1959). Participou na Itália de Congresso de Direito Administrativo (1960). Fez parte das missões de observadores das eleições na República Dominicana (1962) e Nicarágua (1963). Foi convidado pela Grã-Bretanha (1966) e pelos EUA (1968) como membro de missão de magistrados. Sofreu o impacto do AI-5, de 1968, e em janeiro do ano seguinte foi afastado de muitas das funções que ocupava. O resto de sua vida será dedicado à advocacia. Leal forjou-se como intelectual e como cidadão atuante em sua sociedade, sendo reconhecido por seus pares.

O livro do eminente jurista tem como foco a relação política de compromissos e trocas assimétricas que se estabelece em um regime político de extensas bases representativas, unidas a um poder privado exorbitante. O autor concebe o conceito do "coronelismo" como "(...) resultado da superposição de formas do regime representativo a uma estrutura econômica e social inadequada. (...) É (...) forma peculiar de manifestação do poder privado.". (Leal; 1976:20)". O privatismo se conjugaria aqui com o mandonismo, o filhotismo, o paternalismo. O excessivo poder dos chefes locais resultaria na perseguição a opositores, na proteção desmesurada (com nomeações públicas) dos próximos e indiferença à lei quando preciso para promover alguma benesse, geralmente às custas de um prévio acordo. O governo estadual daria "carta-branca" ao poder local dos "coronéis" (conferia "autonomia extralegal"), que promoveriam melhorias nos serviços e utilidades públicas, trazendo também eleitores – estes dependentes do "coronel" devido à estrutura agrária – que legitimassem a eleição dos candidatos estaduais. A forma de voto forçada a que os dependentes do senhor se submetem chama-se voto de cabresto. Esse sistema é chamado de coronelista e será base de entendimento para interpretações posteriores. Existe devido à ascensão do poder público, notadamente o estadual, simultaneamente ao declínio do poder privado, notadamente o dos latifundiários. A falta de autonomia no plano municipal faz com que os chefes políticos locais negociem com a instancia pública.

Esse entendimento é peculiar de Leal, que irá contra o senso comum acadêmico de sua época que apontava para a lógica oposta, alegando que o coronelismo era uma tendência típica do fortalecimento do poder privado frente ao enfraquecimento do poder público. O pensador prova que, ao longo dos anos, desde a Colônia até a Constituição de 1946, o poder municipal foi paulatinamente se fortalecendo. E ao mesmo tempo várias e consolidaram condições de extinção do poder dos chefes locais, tais como a mudança na estrutura familiar, a abolição da escravatura, a decadência do modelo agrário-exportador. O autor sustenta que não havia mais concentração de riqueza ou poder suficiente para os senhores rurais, o que fazia com que eles buscassem amparo dos poderes estaduais. Dá-se então a conservação residual do poder privado frente à crescente ingerência do poder público através do sistema. Não há, portanto, dialética ou dualismo entre público e privado; há nesse caso um entrelaçamento entre ambas as esferas que se nutrem uma da outra. O Estado proveria os cargos públicos, o controle da polícia e o erário ao poder local; o coronel proveria votos para os líderes estaduais e melhorias públicas para o município e seus dependentes. A descentralização e o aumento do poder tributário, legislativo e executivo do âmbito municipal seriam o meio enfraquecedor do sistema coronelista, que tem seu auge na República Velha. Contudo, engana-se quem considera tal questão política como datada, pois o autor assim argumenta:

 A morte aparente dos "coronéis" no Estado Novo não se deve, pois, aos prefeitos nomeados, mas à abolição do regime representativo em nossa terra. Convocai o povo para as urnas, como sucedeu em 1945, e o "coronelismo" ressurgirá das próprias cinzas, porque a seixa que o alimenta é a estrutura agrária do país . (LEAL; 1976: 134).
O termo "coronel" surge quando em 1831 é criada a Guarda Nacional, que terá grande destaque sufocando rebeliões regionais e na Guerra do Paraguai. Para ter o título de coronel era preciso pagar uma soma, com o que muitos não podiam arcar. Com isso, sobrepunha-se muitas vezes o poder econômico do latifundiário ao poder sócio-político, através de um monopólio legítimo da força municipal obtido de forma censitária. O sistema coronelista se erige em um tripé: os acordos entre "coronéis" e lideranças políticas estaduais (coronelismo), a concentração fundiária (enxada) e um déficit de autonomia municipal que permitiria o surgimento do voto de cabresto (voto).

Para desenvolver seu ensaio acadêmico, Victor Nunes Leal divide seu livro em sete capítulos. O primeiro define o coronelismo; o segundo, as atribuições do município; o terceiro, a eletividade. O quarto analisa as receitas municipais; o quinto enfoca a organização policial e judiciária; o sexto disserta sobre a legislação eleitoral e o sétimo exibe prospecções e retoma a discussão teórica do primeiro. É um livro bem-estruturado, pois abarca um longo período histórico de forma concisa, tratando desde o Brasil colônia até a redemocratização de 1946. Pode ser considerado um clássico interdisciplinar porque congrega discussões de administração pública, direito, ciência política, história e sociologia. A pesquisa realizada é intensa e extensa: abusa de fontes primárias e usa com sabedoria as fontes secundárias. Utiliza-se de estatísticas, documentos oficiais, discursos de personagens históricos, pesquisa bibliográfica de aporte teórico e factual. Auxilia sua produção uma visão realista e sociológica do normativo, incomum a muitos juristas, que ficam sufocados num etéreo divagar sobre as leis. Vale lembrar que o final do livro é um libelo à humildade e à sobriedade da análise, que conclama à resolução do problema. Leal finaliza seu trabalho, afirmando:
Com esta singela contribuição ao estudo do "coronelismo", não tivemos o propósito de apresentar soluções; apenas nos esforçamos para compreender uma pequena parte dos nossos males. Outros, mais capacitados, que empreendam a tarefa de indicar o remédio.
(LEAL; 1976: 258 )
Autor:   João Henrique Catraio Monteiro Aguiar. Bacharel (2008) e licenciado (2008) em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ. VoxJuris | Ano 2, v. 2, n. 1, pág. 415-418, 2009

Bibliografia: LEAL, Victor Nunes. Coronelismo, Enxada e Voto. 3ed. São Paulo: Alfa Ômega, 1976.



18 comentários:

  1. O texto se refere ao Coronelismo como uma estrutura social inadequada, um poder excessivo dos chefes locais, perseguicoes aos opositores,protecao dos proximos e familiares, indiferenca as leis e “carta branca” do governo para os coroneis que trariam os votos daqueles que eram dependentes dele, o chamado “voto de cabresto” atraves do sistema agrario.
    O coronelismo esta presente em obras da literatura brasileira como na obra de Jorge Amado – Gabriela Cravo e Canela, onde podemos observar as caracteristicas citadas acima como realidade na historia ficticia.
    Ainda hoje podemos ver casos de coronelismo no nordeste do Brasil como os “coroneis da agua”( Folha de S.Paulo- 06/08/2012), onde para se receber agua dos caminhoes-pipa tem que se votar no candidato daquele que controla os caminhoes.
    Existe hoje tambem o “coronelismo eletronico” onde a midia de massa e usada para formar e influenciar a populacao de maneira muito abrangente e eficaz.Nossos politicos controlam ¼ das emissoras de televisao (60 de 250). Infelizmente o coronelismo ainda esta muito mais presente na politica e na vida de muitos brasileiros do que pensamos!

    Colégio Ser! Isabelle Binder 9 Ano CDA

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    1. Isabelle, gostaria que você me informasse qual a fonte de pesquisa para os dados estatísticos mencionados em seu comentário. Profª Marilia Coltri.

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  2. O texto fala sobre o coronelismo que sempre ''mandou'' em tudo, os coronéis eram todos unidos a favor de uma mesma idéia politica de sua regiao, os coronéis ditavam as regras, eles manipulavam a economia de sua regiao, eles, os chefes da regiao, os coronéis tinham que pagar um alto valor, que muitos nao tinham condicoes, entao nao eram muitos que tinham o poder do mandato.
    O texto refere-se também ao livro do Victor Nunes Leal que divide seu livro em sete capitulos, e o primeiro fala sobre o Coronelismo.
    O texto também fala sobre o Voto de Cabresto, que era o voto comprado, era um voto obrigado, e que ficavam os capangas dos coronéis fiscalizando a pessoa votar, para ver se votava mesmo na pessoa mandada, era voto aberto.


    Colégio Ser! Lais Merigio 9 Ano CDA

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  3. O texto trata-se sobre o coronelismo que na época era um tipo de poder estabelecido, pelos coronéis.
    Com vários tipos de votos:
    .Voto de Cabresto
    .Voto Fantasma
    .Voto Comprado
    .Voto Aberto
    Esses são os tipos de votos para melhor chances de ganhar as eleições.
    O texto refere-se ao livro do Victor Nunes Leal, o livro é dividido em sete capítulos e um deles traz o coronelismo.
    Naquela época os eleitores eram tratados como burros por serem facilmente manipulável.
    E o coronelismo está representado no livro Gabriela Cravo e Canela, do famoso escritor Jorge Amado.

    Colégio Ser! Vitor Guimarães Proença 9 Ano CDA

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  4. O texto fala um pouco sobre o Coronelismo. O Coronel era um fazendeiro importante que aproveitava do seu poder econômico para eleger os candidatos que apoiava.
    O Livro "Coronelismo, Enxada e Voto" de Victor Nunes Leal é muito importante para quem quer aprofundar seus conhecimentos sobre o Coronelismo. Victor divide seu livro em sete capítulos e cada um fala sobre um "tópico" importante para que possamos entender melhor sobre esse assunto. O livro é bem estruturado, e permite que as pessoas possam saber melhor sobre o Coronelismo, já que Victor realmente entendia sobre o assunto.
    O voto de cabresto que também está presente no texto, é uma característica do Coronelismo. Esse voto era um sistema tradicional de controle do poder político através do abuso da autoridade (Coronéis). Eles utilizavam a compra de votos, ou a máquina pública. O Coronel, as vezes, até violentava os eleitores do curral eleitoral para que votassem nos candidatos apoiados por ele. E já que o voto era aberto, havia uma grande pressão dos Coronéis nesses candidatos do curral eleitoral.
    Colégio Ser! Giovana Mota 9º Ano CDA.

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  5. Cidadã, Os coronéis fazendeiros não eram militares de carreira, pertenciam à Guarda Nacional, milícia da qual teoricamente fazia parte todos os eleitores. No Império (1822-1889), o voto era censitário (baseado na renda), só uma elite votava.
    Os fazendeiros adquiriam legalmente a patente de coronel, que lhes dava o direito de constituir tropas provisórias em caso de conflito. Dessa forma, controlava também a polícia, seu instrumento predileto para abusar do poder.
    O presidente Campos Sales criou a "política dos governadores”. Sem uma legislação que os protegesse, os trabalhadores rurais, por concessão dos coronéis, residiam dentro das fazendas e recebiam um ordenado miserável. Em troca disso, aceitavam o "voto de cabresto", elegendo os candidatos apoiados pelo patrão. Durante a República Velha, a votação não era secreta, o que permitia a constatação do voto pelos membros da mesa eleitoral. Os desobedientes sofriam desde uma advertência verbal até o castigo físico, além de correrem o risco da perda do emprego e da moradia.
    Thieli Laiz Gomes 9º ano CDA

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  6. Os Coronéis eram homens poderosos que se aproveitavam de seu poder econômico para eleger o candidato que apoiava.
    Existia também o voto de cabresto das quais o coronel aproveitava do povo que que era analfabeto funcional para votar no candidato do qual apoiava
    Giovanni Colli
    9°ano Caio F Abreu

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  7. Coronelismo é a forma de governar exercida por um chefe, normalmente um dono de grandes terras, um fazendeiro.É normalmente eleito através do voto de cabresto, um voto direcionado, onde os eleitores são subornados, e onde há total controle pro parte desse chefe nas decisões do Estado.

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    1. Veja bem, Gabriel; o coronel não se candidatava a cargo eletivo algum; manipulava sim seus agregados, para estes votarem nos candidatos apadrinhados. Profª Marilia Coltri.

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  8. O título coronel,referindo-me aos fazendeiros,não era usado para expressar que eles eram militares e sim relacionado a sua superioridade.
    Os coronéis eram grandes fazendeiros ,que tinham certa autoridade local.Nunca assumiam cargos políticos e manipulavam os votos,conhecidos como "Votos de cabresto".

    Bruno Kenji 9ºano CFA

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  9. "Coronelismo é o termo criado para designar certos hábitos políticos e sociais próprios do meio rural brasileiro, onde os grandes proprietários rurais, chamados de 'coronéis', exerciam absoluto domínio sobre as pessoas que viviam em suas terras ou delas dependiam para sobreviver". No voto de cabresto, os "coronéis" forçam e aproveitam do vinculo que tem com seus trabalhadores e agregados de sua família, para votarem em um determinado candidato, que concorrerá a presidente.

    Pâmela e Mariana 9º ano CDA
    Colégio Ser !

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    1. Por ter sido feito em dupla, o comentário deveria ter um grau maior de aprofundamento da questão proposta. Profª Marilia Coltri.

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  10. O ''Voto de cabresto'' foi algo que marcou muito o Coronelismo. O sistema eleitoral era muito frágil e fácil de ser manipulado. Os coronéis compravam votos para seus candidatos ou trocavam votos por bens matérial.Como o voto era aberto, os coronéis mandavam capangas para os locais de votação, com objetivo de intimidar os eleitores e ganhar votos. Coisas que também marcaram o Coronelismo foi a Política do Café com Leite, onde os políticos de São Pauli e Minas Gerais faziam acordos para perpetuarem-se no poder central. São Paulo produzia café, e Minas Gerais leite, por isso esse nome. E temos também a Política dos Governadores,onde os governadores dos estados e o presidente da República faziam acordos políticos, na base da troca de favores, para governarem de forma tranquila. Os governadores não faziam oposição ao governo central e ganhavam , em troca deste apoio, liberação de verbas federais.
    Paula Tilelli, 9º CDA.
    Colégio Ser!

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